07 de Dezembro de 2025
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Cidades Segunda-feira, 17 de Novembro de 2025, 17:03 - A | A

Segunda-feira, 17 de Novembro de 2025, 17h:03 - A | A

falha no atendimento

TJMT mantém indenização de R$ 100 mil a mãe de jovem morto por asma

Tribunal reconhece culpa do serviço pela omissão no atendimento de paciente em crise grave de asma e consolida tese de que a perda da chance de sobrevivência também gera dever de indenizar.

Rojane Marta/Fatos de MT

A Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) manteve a condenação do Município de Castanheira ao pagamento de R$ 100 mil em indenização por danos morais à mãe de um jovem de 26 anos que morreu após crise grave de asma, mas alterou os critérios de atualização da dívida e o valor dos honorários advocatícios. A decisão foi tomada por unanimidade em sessão realizada em 11 de novembro de 2025.

O caso envolve a morte de Welliton Araújo Bogado da Rosa, em 6 de fevereiro de 2023, após uma sequência de atendimentos considerados inadequados em unidade de saúde da zona rural do município e posterior encaminhamento tardio à sede de Castanheira. A ação foi proposta pela mãe do paciente, Claudineia Braga de Araújo, que acusou o município de negligência e falha na prestação do serviço de saúde.

Na primeira instância, a Justiça já havia reconhecido a responsabilidade do município e fixado indenização de R$ 100 mil, com atualização pelo IPCA e juros de 1% ao mês, além de honorários de 10% sobre o valor da condenação. O Município recorreu, alegando ausência de culpa, falta de nexo causal e excesso no valor da indenização. Subsidiariamente, pediu redução para R$ 20 mil e a aplicação exclusiva da Taxa Selic.

Relator do recurso, o desembargador Márcio Vidal rejeitou os argumentos sobre inexistência de falha no serviço e manteve o valor da indenização. Ele destacou que a responsabilidade civil do Estado pela prestação de serviços de saúde é objetiva, nos termos do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, e que, no caso concreto, ficou caracterizada a chamada “culpa do serviço” — quando o serviço não funciona, funciona mal ou funciona atrasado.

Segundo o acórdão, o jovem procurou atendimento no posto de saúde da comunidade Nova Conquista com grave crise respiratória, apresentando falta de ar intensa, sudorese e agitação. No entanto, foi medicado com Dipirona e Bromoprida, fármacos incompatíveis com o quadro de asma grave descrito nos autos.

Diante da piora, o pai tentou novo socorro e relatou à enfermeira de plantão a gravidade da situação. A profissional, contudo, teria se recusado a enviar ambulância naquele momento, orientando que aguardassem até o amanhecer e desestimulando a ida à sede do município, ao afirmar que “ninguém os atenderia fora de hora”.

Sem alternativa, a família decidiu transportar o paciente por conta própria em ambulância conduzida apenas pelo motorista, sem acompanhamento de profissional de saúde e sem equipamentos adequados de suporte à vida, em trajeto de cerca de 50 km por estrada de chão. Ao chegar à unidade de pronto atendimento de Castanheira, nas primeiras horas da madrugada, o jovem ainda recebeu medicação, mas não resistiu e morreu em seguida. A causa do óbito foi registrada como insuficiência respiratória aguda decorrente de asma grave.

Para o relator, o conjunto de provas — incluindo documentos, relatos da família e registros de atendimento — demonstra que houve falha relevante na prestação do serviço público, tanto na avaliação inicial do quadro quanto na condução do atendimento de urgência e no transporte.

O acórdão destaca que, mesmo que não seja possível afirmar com certeza que o paciente sobreviveria com atendimento adequado, a omissão e o manejo inadequado do caso reduziram significativamente suas chances de sobrevivência, o que configura a chamada “perda da chance” e sustenta o dever de indenizar.

Márcio Vidal também considerou que o valor de R$ 100 mil está alinhado com a jurisprudência do próprio Tribunal em casos de morte decorrente de falha no atendimento médico, e atende aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, diante da gravidade do fato e do abalo psicológico sofrido pela mãe.

Apesar de manter a condenação e o valor da indenização por dano moral, a Terceira Câmara modificou dois pontos da sentença: determinou que a indenização seja atualizada exclusivamente pela Taxa Selic, desde a data do evento danoso (06/02/2023), em consonância com a Emenda Constitucional nº 113/2021 e a Lei nº 14.905/2024, vedando a cumulação com outros índices de correção e juros; e ajustou os honorários advocatícios sucumbenciais para R$ 5 mil, fixados por apreciação equitativa, de acordo com a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 1.313, que trata das causas envolvendo o direito à saúde.

A decisão reafirma duas teses: a de que a omissão ou falha grave em atendimento médico na rede pública pode gerar responsabilidade objetiva do ente público, inclusive com base na perda da chance de sobrevivência, e a de que, em condenações contra a Fazenda Pública, a atualização deve seguir os parâmetros mais recentes definidos pelo STF, STJ e pela legislação federal.

Com o trânsito em julgado, o acórdão ainda prevê o envio de cópia dos autos à Procuradoria-Geral do Município para eventual ajuizamento de ação regressiva contra o agente público considerado responsável pelo dano.

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