A desembargadora Helena Maria Bezerra Ramos, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, negou provimento a agravo de instrumento interposto por Jackeline Vieira dos Santos Manganaro e manteve decisão da Vara Única de Sapezal que rejeitou a tese de prescrição intercorrente em ação civil pública de ressarcimento ao erário por ato de improbidade administrativa. O processo originário foi proposto pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso e tramita desde 2017.
A defesa da agravante sustentava que a ação teria sido ajuizada após o prazo prescricional de oito anos previsto na redação atual da Lei de Improbidade Administrativa e que, desde o ajuizamento, já teriam transcorrido outros oito anos sem qualquer marco interruptivo válido, o que caracterizaria a prescrição intercorrente da pretensão sancionatória. Alegou ainda que, à luz da Lei 14.230/2021, os princípios do direito administrativo sancionador e a retroatividade da norma mais benéfica deveriam alcançar o novo regime de prescrição.
Ao analisar o recurso, a relatora destacou que a controvérsia gira em torno da aplicação das inovações da Lei 14.230/2021 em conjunto com os entendimentos já firmados pelo Supremo Tribunal Federal nos Temas 897 e 1199 de repercussão geral. Ela lembrou que o STF reconheceu a imprescritibilidade da ação de ressarcimento ao erário fundada em ato doloso de improbidade, mas condicionou essa exceção à comprovação clara do dolo, ou seja, da intenção deliberada de causar prejuízo ao patrimônio público.
A desembargadora ressaltou que, no sistema jurídico brasileiro, a regra é a prescrição e a imprescritibilidade é medida excepcional, que só se aplica quando demonstrado o dolo qualificado. Por isso, não basta a existência de irregularidades administrativas ou apontamentos de tribunais de contas para afastar a incidência dos prazos prescricionais. É necessário examinar, em instrução probatória, se houve ou não conduta dolosa.
Sobre a Lei 14.230/2021, Helena Ramos registrou que o STF autorizou a retroatividade apenas das normas de natureza material mais benéficas ao réu, como a exigência de dolo específico para configuração do ato de improbidade e o fim da modalidade culposa. Em contrapartida, as regras que tratam de prazos de prescrição e prescrição intercorrente foram classificadas como normas de conteúdo híbrido, material e processual, e, por isso, não podem retroagir para atingir atos processuais já praticados.
Nesse cenário, a relatora afirmou ser “prematuro e juridicamente inviável” reconhecer, na fase atual do processo, a inexistência de dolo ou presumir sua ausência apenas para aplicar a prescrição intercorrente e extinguir a ação. Segundo ela, a avaliação do elemento subjetivo exige dilação probatória, com produção de provas e contraditório pleno na origem.
O agravo também alegava omissão do juízo de primeiro grau quanto à possibilidade de celebração de Acordo de Não Persecução Cível, previsto na nova Lei de Improbidade. A desembargadora afastou a tese, lembrando que o instituto tem natureza negocial, depende de iniciativa das partes legitimadas, especialmente do Ministério Público, e não se trata de obrigação imposta ao juiz. Assim, a ausência de proposta não configura vício nem exige manifestação judicial de ofício.
Ao final, com base na Súmula 568 do Superior Tribunal de Justiça, que autoriza decisões monocráticas quando há entendimento dominante sobre o tema, Helena Ramos negou provimento ao agravo e manteve integralmente a decisão que havia rejeitado os embargos de declaração e afastado a prescrição intercorrente. A ação de ressarcimento seguirá tramitando na comarca de Sapezal, onde ainda será feita a análise de provas e do eventual dolo na conduta atribuída à ré.










